Maria Thereza Wundheiler

Projeto Andrews 90 anos

Entrevista com Maria Thereza Wundheiler

Rio de Janeiro, 26 de setembro de 2007

Entrevistadora Regina Hippolito

 

Onde e quando você nasceu?

 

MT: Nasci em 1928 no Rio de Janeiro. Meu pai era cearense e minha mãe era mineira. Duas pessoas de famílias bem tradicionais, de educação a moda antiga.

 

Onde você fez seus primeiros estudos?

 

MT: Fui aluna do Instituto Lafayette que, na época da minha infância, era um dos grandes colégios do Rio de Janeiro.

 

Você fez todos os seus estudos lá?

 

MT: Não, só a partir do Admissão, porque no curso Primário eu não fui à escola. Fiquei lá até terminar o Ginásio, quando tinha 15 anos. Fiz um concurso de desenho e passei. Com isso, pelas normas do concurso eu ganhei uma bolsa de estudos para fazer o curso na Escola de Belas Artes. Fui então a Escola de Belas Artes e lá encontrei o diretor, professor Augusto Brassé, que era um artista e de quem eu fui amiga o resto da vida. Ele me disse: “Isso é um dos disparates maiores que eu já vi. Que bolsa é que vão dar para a senhora? Belas Artes é uma escola do governo, aqui ninguém paga nada, não tem bolsa nenhuma. Você pode vir, mas só que você está vindo atrasada. Em todo caso, se você quer tentar a experiência, você tenta. Você vai ter que arranjar alguém que te ensine geometria descritiva.” Como eu não tinha nada a perder, resolvi fazer. Passei nos exames e fiquei na escola. Fiz o curso todo. Naquela época eram quatro anos. Depois fui fazer mais um ano na Faculdade Nacional de Filosofia para ter o diploma de professor. A Escola de Belas Artes não dava diploma.

 

Quando você se formou na Faculdade Nacional de Filosofia?

 

MT: Em 1949. No início não trabalhei como professor. Fui fazer o meu trabalho de desenho e passei por várias experiências, desenho técnico, desenho comum. Só não passei pelo que deveria ter passado segundo os professores da Escola de Belas Artes, que achavam que eu deveria ter sido uma ilustradora.

 

Qual foi seu primeiro emprego?

 

MT: Foi de desenho técnico na Escola de Medicina da Universidade do Brasil. Fiquei trabalhando lá com um médico durante muito tempo. Mas não estava contente. Aconselhada por algumas pessoas fui conversar com o Augusto Rodrigues, que era uma pessoa muito persuasiva e me atendeu muito bem. Ele me disse que não me ofereceria um emprego porque não poderia pagar, mas me sugeriu ficar lá com ele enquanto não arrumasse um emprego. E aí começou a grande virada. Foi ali que houve a grande modificação. Eu estava muito interessada com a história do Augusto. Primeiro era o lugar onde passavam todas as grandes cabeças da Arte, dos ilustradores, da pintura; aquilo em sim já era uma faculdade.

 

Onde funciona o escritório do Augusto Rodrigues?

 

MT: Quando eu conheci, a Escolinha de Arte funcionava na cidade. Ele tinha começado com umas turmas para crianças e, eventualmente, ele fazia aulas para os professores interessados. A Escolinha era uma espécie de ponto de reunião, onde passavam os artistas de todo tipo. O próprio Augusto ficava lá. Naquele tempo ele fazia desenho para jornal.

 

Para qual jornal ele trabalhava?

 

MT: Ele trabalhou para a Última Hora e outros que não me lembro mais. A Escolinha foi um dos lugares mais estranhos e, ao mesmo tempo, mais interessantes que eu conheci. Para quem quisesse mexer com arte, era um lugar extremamente indicado para se conhecer, porque artista não pode ser muito amarrado à rotina. Ao mesmo tempo, tinha-se a oportunidade de conhecer todas as grandes cabeças da arte popular ou erudita que passavam por lá. Grandes compositores e cantores passavam também por lá. Tinha as aulas das crianças que eram em horário certo e tinha aulas que o Augusto promovia. Ele fazia uma série de conferências e convidava todas as pessoas que tinham nome. Em 1958 fui para a Inglaterra assistir a um curso de arte e educação baseado em Herbert Reed.

 

Quanto tempo você ficou na Inglaterra?

 

MT: Eu fiquei lá alguns meses. Ainda na Inglaterra eu recebi uma carta do Onofre me perguntando se eu queria ficar com algumas aulas dele, e que o doutor Carlos Flexa Ribeiro estava pensando em introduzir um curso de Arte. Ele já tinha falado inclusive com o Augusto Rodrigues.

 

Como foi o seu contato com o doutor Carlos?

 

MT: Fui conversar com ele junto com o Augusto Rodrigues. O Augusto sugeriu que o curso funcionasse naquela sala da frente onde estava a biblioteca na Praia de Botafogo. Montaram aquela sala, dividindo com a biblioteca. De início o curso era só para a quinta série. Conversei com o doutor Carlos e ele me perguntou se eu seria capaz. Eu disse que sim. Que nunca tinha feito, mas iria tentar. De início eu fiz uma apresentação do projeto do curso. Dei essas aulas até o final do ano e, no ano seguinte, em 1959, ia começar com essa turma de quinta série. No início meu curso foi muito baseado no princípio inglês. Tem-se deixar começar a aula pelo espontâneo. Então, os alunos gastavam papel, faziam o que queiram. Eles regrediam. Naquela época, a dificuldade era conseguir um professor que desse o curso. Se ele não fosse a pessoa indicada, acabava dando desenho geométrico ou algo que não era arte e educação.

 

Você teve todo o apoio para dar esse curso no Andrews?

 

MT: O doutor Carlos sempre me apoiou. Ele dizia para eu ser econômica com o material, mas para fazer o necessário que a escola providenciaria. E veio a solução, em vez de o aluno ir para a rua, comprar um monte de coisas que ele não sabia o que era então a escola comprava e cobrava do aluno uma taxa. E deu muito certo.

 

Quando tempo você ficou dando aula no Andrews?

 

MT: Eu trabalhei lá 23 anos.

 

Durante o período que você esteve no Andrews, você acha que o colégio viveu fases diferentes?

 

MT: Variava porque cada professor dava aula da sua maneira. Tinha o caso da Marília, que mantinha o tipo de aula da escolinha de arte. Ela dava aula só na Visconde de Silva. Eu ainda fui para lá, quando eles mudaram a sexta série para a Visconde. Marília ficou com as turmas dela e nós, eu e a Regina Vilela, ficamos com as nossas.

 

Você dava aula para que turmas?

 

MT: Para a quinta e sexta séries. A Marília gostou da maneira que nós trabalhávamos. Nós dávamos a nossa moda. Não há porque a criança não ir adiante. Se você proporcionar as experiências, ela vai se interessar e vai crescer de produção.

 

Voltando a pergunta, você viu alguma modificação no colégio durante esses 23 anos que trabalhou?

 

MT: A aula se manteve mais ou menos igual. Até porque eram muitos professores. O colégio era grande, tinha muitas turmas, e nós não dávamos aula para todo mundo. E tínhamos a liberdade de planejar a nossa aula. Isso acontecia também com todos os outros professores. Eu e o Onofre levávamos os alunos para desenhar fora do colégio. Fomos à praia, ao Jardim Botânico, à praça. Tinha um ônibus que nos levava e ficava esperando para nos trazer de volta.

 

Você pegou diferentes direções no Andrews, você viu diferenças entre elas?

 

MT: As aulas de arte ficaram de um jeito que os professores não mudavam muito. Quem resolvia o problema imediato do manejo das turmas era o professor Aluísio.

 

Você destacaria algum elemento na orientação pedagógica do Andrews em relação a outros colégios?

 

MT: A orientação eu continuo achando muito sensata muito boa. Era um colégio que tinha chegado a uma determinada consideração sobre o aluno. O aluno deveria estudar, cobrava-se dele o resultado, porque o colégio tinha um nível muito alto. Isso é importantíssimo, você cobrar do aluno aquilo e, sendo assim, você tinha que dar a ele a oportunidade de entender melhor, dele estudar melhor. Sempre vi isso lá, uma cobrança muito séria. Se eles não fizessem essa cobrança eles não tinham titulação.

 

Qual foi a importância do Colégio Andrews em sua vida?

 

MT: Foi muito grande. Primeiro foi o lugar em que eu resolvi finalmente ser professora. A gente trabalhou muito e o esforço foi muito grande. Ter descoberto algo que chamava arte e educação foi muito importante.

 

Você se lembra de alguns alunos do Andrews?

 

MT: Sim, mas não me lembro dos nomes.

 

De uns tempos para cá muitos colégios fecharam, o que você acha que o Andrews tem que está resistindo ao tempo e vai fazer 90 anos em 2008?

 

MT: Primeiro acho que eles eram pessoas objetivas, que tinham pensado muito bem um assunto que eles conheciam. Quem fez aquilo foi a mãe do dr. Carlos que era uma professora e queria ser. Isso é fundamental. Era o primeiro passo. O dr. Carlos também foi professor, depois foi para a universidade, mas gostava de dar aula, e sempre procurou manter um nível alto, já que ele fez um colégio que se dedicava à classe que podia estudar. O nível dele sempre era o mesmo porque ele se dirigia a mesma clientela de aluno.

 

Quando você deu aula no Andrews o Onofre ainda dava aulas lá?

 

MT: O Onofre esteve lá, mas nessa época ele já estava estudando para a tese de doutorado. Ele ainda deu aula junto comigo algum tempo. Nós fomos colegas desde a Escola de Belas Artes. Passamos uns tempos sem nos ver e fomos nos reencontrar na Escolinha de Artes do Augusto Rodrigues. Ele tinha ido lá e gostado daquilo. Foi o único professor de arte que eu vi que se interessou pelo desenho espontâneo.

 

Muito obrigada pelo seu depoimento.

 


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