Projeto Andrews 90 anos
Entrevista com Lúcia Hippolito/Ex-aluna e ex-professora
Rio de Janeiro, 7 de novembro de 2007
Entrevistadora Regina Hippolito
Onde e quando você nasceu?
LH: Nasci em Bauru, interior de São Paulo. Sou filha do meio de três mulheres. Meu pai era do Banco do Brasil e trabalhou em vários lugares. Morei nove anos em Garça, dois anos em Marília, seguimos sempre a carreira dele. Depois ele foi para a direção geral do Banco do Brasil, no Rio de Janeiro, e daqui eu nunca mais saí.
Onde você fez seus primeiros estudos?
LH: Fiz o Jardim de Infância em um colégio de freiras em Garça. O primário na escola pública Grupo Escolar Professor João Crisóstomo. O quarto ano primário junto com o Admissão fiz já em Marília, em 1960. E o primeiro ano ginasial no Ginásio Estadual de Marília.
Qual foi o seu primeiro contato com o Colégio Andrews?
LH: Entrei no Andrews para fazer o segundo ano ginasial quando fomos para o Rio de Janeiro, em 1962. Saí formada no curso Clássico em 1967. Depois voltei para trabalhar no Colégio como professora em 1971 e trabalhei até 1976. Lecionei História e Sociologia.
Você se lembra dos professores e dos colegas do Ginásio?
LH: A minha turma já vinha junto desde o primário. Isso acontecia muito no Andrews. Eu entrei no segundo ginásio e fiquei até o quarto ginásio. Depois nos dividimos entre o Clássico e o Científico. Tenho mais lembranças da minha turma no Colégio Andrews do que na universidade, porque eu já entrei no regime de créditos, que não forma uma turma.
Tive o privilégio de ter grandes professores no Andrews, e de tipos muito variados. Quero homenagear dois professores porque acho que eles representam muito o colégio. O primeiro é o Carlos Shankrow Maia, que é indiscutivelmente o maior didata que eu já vi. Médico de formação e professor de Matemática, Biologia e Ciências. Um extraordinário professor, tinha amor por aquilo que fazia, acumpliciava e entusiasmava o aluno. Era um homem grande, bonito, com uma cabeleira branca, olhos azuis; ao mesmo tempo, muito paternal. Os alunos eram apaixonados por ele, e eu não fugia à regra.
A segunda é a madame Blanche Jacobina, professora de Francês. Ela era francesa, usava sapato de salto grosso, rinsagem roxa no cabelo, uns vestidos de flores. Eu nunca tinha estudado Francês e estudei como uma louca para ela gostar de mim. Como resultado, quando saí do Colégio Andrews e fui fazer prova para a Aliança Francesa, entrei no oitavo ano, em um curso de nove anos. Eu hoje falo Francês razoavelmente bem, o meu Francês eu aprendi com a madame Jacobina.
Tinha também o Antonio Carlos Amaral do Azevedo, professor de História maravilhoso. O Arthur Sette, professor de Desenho fantástico. O professor Francisco Pimenta de Moraes, de Português. O professor Luis Alfredo Garcia Rosa, de Filosofia. Marion Penna, professora de Psicologia. Eva e Perla Sionai, professoras de Inglês. Maurício Silva Santos, grande professor de Geografia.
Você participou das peças que a madame Jacobina montava?
LH: Participei de uma única peça chamada L’ouseau bleu. Eu fazia la joie de l’été, eu entrava muda e saía calada, com uma fantasia amarela, era a alegria do verão que entrava saltitante no meio da peça. Fui muito aplaudida, a peça foi um espetáculo.
E seus colegas?
LH: Me lembro do Luis Leonardo Catidiano, grande advogado, foi presidente da CVM recentemente. Outro que me lembro é o Merval Pereira, grande jornalista. O senador Tasso Gereissatti. Ilana Strozemberg, antropóloga. Márcia Rodrigues, atriz. Ivan, que está casado com a Lília Cabral. Gilberto Santeiro, cineasta. Maria Clara Peregrino, psicanalista. Ana Lúcia Chama, antropóloga.
Havia as turmas tradicionais e as classes experimentais?
LH: Não. Na minha época o Ginásio todo já era experimental porque a Lei 4024 tinha entrado em vigor. As aulas de Artes Plásticas eram muito interessantes. Nós saíamos do colégio e íamos para a frente dele, onde havia um grande jardim entre as duas pistas de rua que existiam naquela época. Fazíamos também excursões ao Jardim Botânico para termos aula de Arte. Descobri as Artes Plásticas no Andrews.
Você teve aula com a Maria Theresa Pena? Ela criou o projeto de Artes Plásticas no Andrews junto com o Augusto Rodrigues.
LH: Não me lembro do nome da minha professora. Me lembro que eu fui do coral do Colégio Andrews. A professora de canto era a Julieta Strutt, cunhada de Villa-Lobos. Quando morreu a mrs. Andrews, uma das fundadoras do colégio, eu cantei na missa, na Igreja Imaculada Conceição.
Você acha que o colégio teve influência na escolha da sua profissão?
LH: Certamente. Os professores de História foram muito importantes. Eu tenho duas matrizes que me formaram na vida, uma é Monteiro Lobato e outra é Max Weber. Sempre pensei em estudar História, mas não sabia como viabilizar isso. O Andrews me deu régua e compasso no sentido de me mostrar que tinha uma profissão nisso que eu gostava. Vi um caminho profissional: vou ensinar, vou ser professora, vou viver disso.
Teve algum fato engraçado ou curioso que ficou marcado para você como aluna?
LH: Fizemos uma greve. Naquele tempo era proibido fumar nas dependências do colégio. E nós resolvemos fumar na sala de aula. Para punir a turma nos colocaram em uma das piores salas de aula, no antigo laboratório de química, os professores reclamaram. Então, nós resolvemos fazer greve, não subimos depois da hora do recreio. No dia seguinte, fomos para o colégio e ficamos na porta, não entramos. O Diretor da época, Edgard Azevedo, não sei por que me identificou como sendo a líder do movimento e me levou para a sala dele. Eu expliquei do que se tratava e, afinal, acabamos conseguindo voltar para uma outra sala, com o compromisso de que ninguém mais ia fumar dentro da sala de aula. Foi um acontecimento emocionante.
Lúcia, qual foi a importância do Colégio Andrews na sua vida?
LH: O Colégio Andrews me deu régua e compasso. Tudo o que eu sou na minha vida eu devo ao Colégio Andrews.
Agora me faz um resumo da sua vida profissional.
LH: Fiquei no Cpdoc, fiz o mestrado, defendi a minha tese e logo depois saí do Cpdoc. Me especializei em partidos, eleições, no Estado brasileiro, em elites políticas etc.
Trabalhei no IBGE, fui chefe de gabinete da presidência e fiz o censo demográfico de 1991. Depois fui convidada para o jornal O Globo, onde fui coordenadora de treinamento da redação.
Em 2002, comecei a fazer o boletim diário na CBN e estou lá até hoje. Voltei para a faculdade, me formei em jornalismo e comecei a trabalhar no UOL News e na Globo News, até que entrei no mundo de palestras. Estou fazendo o que gosto, do jeito que gosto, e num ofício que busco fazer com a maior seriedade possível, mas onde me divirto muito.
Muito obrigado pelo seu depoimento.

Lúcia Hippolito
90 anos do Colégio Andrews